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MPF/RJ entra com ação para anular nomeação de militar que fraudou sistema de cotas

Falha no processo de autodeclaração possibilitou que candidato branco fosse aprovado como cotista em concurso na Marinha

O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública, com pedido de liminar, para anular a nomeação e posse de Luiz Guilherme Assad Lemos no cargo de segundo-tenente da Marinha. O militar, que é branco, foi aprovado em vaga destinada a pessoas negras ou pardas, segundo o sistema de cotas previsto no Concurso Público para Ingresso no Quadro Complementar de Oficiais Intendentes da Marinha (CP-QC-IM), concluído em 2018.

 

Os fatos da ação foram apurados no inquérito civil nº 1.30.001.000471/2018-51, instaurado a partir de representação que questionava a aprovação, no referido concurso, de “pessoa notadamente caucasiana, não sendo dotada de traços nem ao menos próximos de uma pessoa considerada parda, muito menos de pessoa negra”. Segundo a representação, a Diretoria de Ensino da Marinha negligentemente teria acatado a falsa declaração do candidato.

Segundo apurou o MPF, Luiz Guilherme, no ato de inscrição, declarou-se “branco”. Posteriormente, contudo, requereu a mudança da declaração, para constar que era “preto” ou “pardo”. Foram anexados ao inquérito e à ação civil fotografias e documentos que não deixam dúvidas de que o fenótipo do militar é o de uma pessoa branca. “Em todo o país, vêm sendo noticiados diversos casos de falsidade na autodeclaração, o que vem dando causa à propositura de ações visando a nulidade do respectivo ingresso eivado de vício”, explicam os procuradores Regionais dos Direitos do Cidadão, Renato Machado, Ana Padilha e Sergio Suiama, autores da ação.

A Diretoria de Ensino da Marinha reconheceu ao MPF que, no concurso de 2017, não verificou se as declarações feitas pelos candidatos cotistas correspondiam à realidade. Afirmou, contudo, que nos concursos futuros será adotado procedimento de heteroidentificação, complementar à autodeclaração feita pelo candidato no momento da inscrição.

Nos termos do art. 2º da Lei 12.990/14, “poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.” O parágrafo único do mesmo artigo, todavia, determina que “na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à anulação da sua admissão ao serviço ou emprego público, após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.”

Para o MPF, a interpretação da Lei das Cotas deve ser no sentido de promover a redução das desigualdades raciais e a implementação da igualdade material. “Independentemente da ideia que se tenha acerca do valor da mestiçagem no quadro da “democracia racial” brasileira, a miscigenação da população brasileira não deve servir para sabotar as políticas públicas voltadas à redução das evidentes e sociologicamente comprovadas desigualdades entre brancos e negros no Brasil”, afirmam os procuradores. “Ainda que possa haver falhas nos métodos de identificação racial e na avaliação do critério da cor da pele, esses desacertos não podem ser utilizados como argumento definitivo para impedir que as minorias sejam incluídas e que as ações afirmativas sejam implementadas no Brasil”, completam.

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