Advogada algemada no Fórum de Caxias ganha ato de apoio

Advogada algemada no Fórum 1 ABr Fernando FrazãoA advogada Valéria Lúcia dos Santos foi o centro das atenções de um ato de desagravo, em frente ao Fórum de Duque de Caxias, que contou com dezenas de pessoas, inclusive o presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Cláudio Lamachia. Valéria, que é negra, foi detida e algemada no último dia 10, dentro do fórum, durante uma audiência, por ordem de uma juíza leiga. A cena foi gravada e causou indignação por todo o país. Mesmo diante disso, no último dia 25, o desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto, presidente da Comissão Judiciária dos Juizados Especiais (Cojes) do Tribunal de Justiça (TJ), considerou que não houve irregularidade no comportamento da juíza leiga Ethel Tavares de Vasconcelos no caso.

A manifestação atraiu advogados e militantes defensores das causas raciais e dos direitos das mulheres, na tarde do último dia 17. Embora o ato tenha sido pacífico desde o início, o prédio teve as portas fechadas, o que deixou os advogados ainda mais inconformados. Lamachia criticou o ambiente de extremismo em que o país vive e disse que a OAB investigará o fato. “Este caso terá vários desdobramentos, na corregedoria estadual, no CNJ [Conselho Nacional de Justiça] e no âmbito da OAB. Porque a colega, juíza leiga, que determinou que Valéria fosse algemada, é uma advogada. Portanto, a sua ação também será examinada sob o prisma ético-disciplinar. Mas o que mais fica deste momento é se nós estamos agindo bem com esta linha de extremismos, de intolerância e de violência, que vimos esta colega sofrer”.

O presidente da seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, chamou de “farsa” a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. “Aquilo não foi um julgamento. Foi um procedimento administrativo montado para passar a mão na cabeça da juíza leiga que cometeu, talvez, uma das maiores indignidades que se possa fazer”, criticou o advogado durante visita à OAB de Rondônia, no último dia 26.

INACEITÁVEL

 Segundo ele, o fato atentou contra o próprio Estado Democrático de Direito: “Algemar uma advogada, dentro de uma sala de audiência, no exercício de sua profissão, é algo inaceitável, sob qualquer aspecto. O meu sentimento é que, naquele momento, a democracia brasileira foi algemada”. Apesar do trauma que o fato lhe deixou, com exposição de imagens compartilhadas por todo o país, Valéria disse que sua atitude será a de conversar com a juíza leiga que determinou a ordem de lhe colocar algemas.

- Eu me sinto muito acolhida, tanto pela OAB quanto pela sociedade civil. Sobre minha colega [juíza leiga], nós duas temos que sentar e conversar. Não é jogar pedra. Para a gente evoluir como pessoa. A gente não pode se dividir, temos de nos unir. Não importa a cor da pele. O que eu quero é que nunca mais isto aconteça. Nunca mais - disse Valéria. A advogada relatou que, no momento em que foi algemada, se sentiu muito mal e ofendida em sua dignidade. “Eu me senti muito ferida. Depois fui para casa e chorei sozinha. Me feriram, mas eu não fui vencida. Olha o que mobilizou o país. O Brasil respondeu. A gente precisa construir um país melhor para os nossos netos”, disse ela. (Agência Brasil)

 

Comissão do TJ isenta juíza

O desembargador Joaquim Domingos de Almeida Neto, presidente da Comissão Judiciária dos Juizados Especiais (Cojes) do Tribunal de Justiça (TJ), considerou que não houve irregularidade no comportamento da juíza leiga Ethel Tavares de Vasconcelos no caso da advogada Valéria. Em relatório divulgado no último dia 25, ele levou em conta depoimentos de advogados que participaram da sessão, de serventuários que presenciaram a cena e dos dois policiais militares e também as imagens que circularam na internet e das câmeras de segurança do Fórum. Ao final do documento, o desembargador concluiu que não houve desvio funcional da juíza. “Assim, forte nas razões ora expostas, não se vislumbra prática de qualquer desvio funcional dos servidores envolvidos e da advogada juíza leiga Ethel Tavares de Vasconcelos”.

O presidente da Comissão de Prerrogativas da OAB/RJ, Luciano Bandeira, em nota, discordou da decisão do desembargador. Bandeira destaca que a OAB só tomou conhecimento da decisão através dos meios de comunicação, uma "vez que não integrou o procedimento, nem pôde participar da oitiva da juíza leiga ou das testemunhas arroladas".

“Causa-nos espécie e estupefação o fato de o tribunal não ter percebido qualquer tipo de ilicitude na inaceitável e reprovável decisão de algemar uma advogada no exercício de sua profissão. O Procedimento Ético Disciplinar no intuito de apurar, adequadamente, a conduta da juíza leiga está em curso em nosso Tribunal de Ética e Disciplina, que, ao contrário do TJ, ouvirá todas as partes, respeitando o direito à ampla defesa, ao contraditório e a todos os princípios legais pertinentes”, destacou.

Procurada para se posicionar sobre a decisão do TJ, a advogada Valéria dos Santos respondeu em nota: "O TJRJ é um órgão corporativista, tipo a Casa Grande, nunca teremos direitos ou garantias perante eles, infelizmente o Brasil é assim, o racismo é velado e institucionalizado". (AE)

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